25/02/2017

poema em loop

esgarçar o plexo
já destruído
apostando em apontar
a flecha da energia e atenção combinadas
para fora

então
esgarçar o plexo
já destruído
apostando em apontar
a flecha da energia e atenção combinadas
para fora

então
esgarçar o plexo
já destruído
apostando em apontar
a flecha da energia e atenção combinadas
para fora

então
esgarçar o plexo
já destruído
apostando em apontar
a flecha da energia e atenção combinadas
para fora

então
esgarçar o plexo
já destruído
apostando em apontar
a flecha da energia e atenção combinadas
para fora

então
esgarçar o plexo
já destruído
apostando em apontar
a flecha da energia e atenção combinadas
para fora

então
esgarçar o plexo
já destruído
apostando em apontar
a flecha da energia e atenção combinadas
para fora

então
esgarçar o plexo
já destruído
apostando em apontar
a flecha da energia e atenção combinadas
para fora

(108 vezes)

então
cansar
e apontar
pro vermelho do próprio coração

23/02/2017

joseph mallord william turner

um céu bruto
ameaça rouco
embarcações

as cores dançam
como fumaça
e a vida
a vida inteira
passa

o último plano
antes da tosse última:
o sol

22/02/2017

tudo água

houve um tempo
houve raras pessoas
em que a coisa fluía

poesia que nos surpreendia aos dois
sem construção, esperança ou depois
tipo adélia
tipo olhar de borboleta
tipo música de zélia duncan
infinito sem esforço, natural

hoje
teimoso e velho
construo demoradamente
(sorrindo do elo de mim mesmo)
arquiteturas impossíveis
engenharias pesadas
castelos difíceis
sabendo que as contas não batem
que os pregos são provisórios
que as vigas não aguentam

hoje só vejo
com olho de percevejo
a ponta
da borda
da quina
do navio
que
naufragará
assim mesmo

(pelo menos
doem menos)

21/02/2017

elis

mulher em forma de pássaro

coração em ti voz
expansão de si - sorriso algoz
força aberta na frágil lira
lágrima quebrada antes do dia
coragem viva que escrita se atira
poesia

19/02/2017

horário: deverão

o som leve dos pássaros
às 6 da manhã de domingo
acorda lentamente
o dos caminhões

avidya

a cada vez
que o batman soca
o olho de alguém
aumenta
sua
cegueira

18/02/2017

rita medusa me inspirou

somos peixes de facebook
construindo
nosso
aquário

atualizações constantes

bolhas de amigos
bombas de ar
muitas bolhas de amigos

aquário quadrangular
igreja de solidões
conectadas a telas
refletindo nossa carência

e ampliando-a

15/02/2017

o poeta é a pedra no meio do caminho do poema

tenho todas as chaves
e não sei
para que
virar as maçanetas

a culpa não é do celular

a culpa não é do celular, desde sempre aprendemos e mantemos o hábito da insatisfatoriedade. esta fome eterna pelo externo apertando nosso esterno e nos afastando do eterno. o celular é só um jeito de ver um filme sem ver um filme enquanto jantamos com fome de uma curtida no facebook, de um coraçãozinho no tinder, de uma resposta positiva em qualquer uma dessas infintas virtualidades. o celular nos permite buscar fora do presente promessas virtuais de "dias melhores virão'', sem nunca sair dessas promessas virtuais, pois sempre podem vir "dias melhores". o celular possibilita andarmos na rua tropeçando um pouco mais ao olhar emails, pensando na chance do novo emprego ou de perder o emprego antigo, na resposta da possível namorada futura ou do possível fim do namoro. mas  sejamos honestos: tropeçaríamos também sem celular. porque deixamos nossa mente querer demais, porque nos habituamos ao estado de carência, porque repetimos este modo de olhar. o problema é a sensação de alívio, conforto e salvação fora de si mesmo, nas coisas do mundo. do fundo do poço da carência, o celular é o brilho falso que nos afunda ainda mais, porque deixamos. porque todo mundo faz. a corda é a generosidade. oferecer em vez de querer. olhar pra fora de si. acorda.

09/02/2017

vou mitar

verbo
de
separação

um livro de poemas é tipo um unicórnio

dormi demais e sonhei que andava pela cidade
do rio de janeiro
até passar num set de filmagem
e reconhecer um poema

eu precisava passar
mas o poema era bom
então deitei no chão e fiquei

vis os efeitos especiais da declamação
a diretora reclamando das pessoas atrapalhando ao chão
a namorada de cabelo cor de rosa com olho brilhando
impressionada porque ele teve uma hora de prosa com um poeta famoso

mas o que mais me impressionou
é que o poema
era bom
então fiquei:

"miraflores de auréolas mirabolantes
acordar com mais de mil palavras na goela
se espremendo pra gritar em ordem revolucionária
que passo
e passo a passo
ainda não me basto
e por mais que me esforce em cada ato
quero gritar pra ser mais amado

o fio da meada o fio da faca o fio da revolução
perdida pro ego
o dom
perdido pra fama
como poemas curtos
que nada dizem
pra ser mais amado
e a fortuna crítica
e os concursos literários
e as conquistas acadêmicas
e as mulheres jovens de cabelo cor de rosa
(com olhos brilhando)
não bastam
nunca bastam

mas é nesta dança
que balança e cansa
que estamos e sempre estaremos
enquanto não virmos
além do breu
além do eu"

era mais ou menos assim
o poema de que eu não me lembro

07/02/2017

mandala vajra

olhamos as coisas e não as vemos. olhamos as coisas e não nos vemos. sem esta separação entre sujeito e objeto nem há linguagem. sem o silêncio primordial, surgem conceitos duais...

olhamos a parede e não vemos o tijolo que a constitui. parece óbvio: parede. parece sólido. é automático. olhamos o tijolo e não vemos o barro de que é feito... assim vai até o infinito.

uma carroça é suas rodas? é suas tábuas? se tirarmos uma roda, continua carroça? qual o limite do que podemos tirar para continuar carroça? e o raciocínio oposto: se juntarmos rodas e tábuas, quando começa a ser carroça? a carroça está no nosso olhar e não percebemos.

linhas traçadas num papel em duas dimensões formam em nós a experiência de um cubo em três dimensões. e nem assim notamos que participamos do que vemos, surgimos junto, criamos junto.

por isso, se estamos num avião caindo sentimos medo. não vemos que não há nem o avião sólido, nem o eu sólido.

fora desta separação, fora do sonho, sem cessar, sem nascer nem morrer, a felicidade verdadeira, incondicionada. silenciosa de conceitos, se reconhecendo lentamente a si mesma em pequenos insights no meio destas letras.

(baseado em vários ensinamentos budistas, do Lama Padma Samten e dos tutores do CEBB)

04/02/2017

la la land

no início parece que vai ser só mais um musical chato, com pessoas cantando do nada, mas melhora muito. lembra o que é cinema, explora as múltiplas possibilidades dessa arte, vai bem além do filme raso, simplório, previsível, padrão de sucesso e de bilheteria. mostra o amor em sutilezas e cheio de verdade. não como o sonho colorido do final feliz, história de príncipes encantados da disney... mostra o amor como o encontro possível, cheio de apesares, momentos errados, planos de vida que bifurcam etc. pé no chão, mas cantado com o coração. pensando bem, graças a esses amores, "dando certo" ou "dando errado" construímos nossas lembranças doces, boa parte de nossa visão de mundo, objetivos e sonhos. não só os amores românticos... quando a luz diminui e a personagem canta a história de sua tia, por exemplo, é maravilhoso ver o poder de um bom encontro (ela e a tia, no caso). uma forma sublime de valorizar os artistas e outsiders que ousam ir além de uma normalidade doente e nos inspiram a fazer o mesmo. os bons encontros nos fazem sorrir pra sempre ao ver ou lembrar um do outro, sem precisar de palavras (que tendem a estragar tudo). agora vai ser assim quando eu pensar em musicais (que tendo a detestar): sorrirei internamente lembrando de la la land (e de moulin rouge) e de como eu me senti cantando junto, o peito querendo explodir, sentado imóvel e silencioso numa sala escura.