30/04/2014

semeando avós

caminhei léguas
de línguas em silêncio
pra achar minha voz

mágoas mínguas restingas
de um desértico mar

cem samambaias
repetindo padrões
em folhas brancas

sem rabos de arraias
aturando patrões
(camisas brancas)

agora o vento no mato
acariciou minha coragem fugaz

vou-me embora pra nunca mais
no exato lugar onde já estou

29/04/2014

(mais de) oito horas por dia

vivemos extremos
(sobrevivemos)
entre excitação máxima e exaustão total
sem nos ver afinal
(lagos serenos)

28/04/2014

adivinhar o mar estando no profundo do rio

o provisório é outra parte do sonho
no qual nos pensamos molhados
entre dois mistérios: nascer e morrer

17/04/2014

como nasce um poema?

inicia-se com alguma palavra rasgando a pele
prossegue-se afastando as costelas
depois cavando a carne
cavucando órgãos desconhecidos
deixando vazios gritarem
soltando monstros e levezas
com precisão e intuição fonética
chegando ao íntimo cerne do escuro e da luz
muito além de si mesmo

depois acaba
e seu corpo ainda quente
e você fingindo não ter buracos nem cores
como se nada tivesse acontecido

15/04/2014

mar

(Para M.)

ao tempo peço adiamento
sei que em areia tudo finda
mas - inevitável - tento:
ela é linda

14/04/2014

o mesmo órgão

estômago fundo:
leveza de borboletas
ou o peso do mundo

estômago quente
doente
digerindo a ele mesmo

estômago a dois:
uma casa
sem depois

estômago a sós:
digerindo
nós

11/04/2014

descanso em cinco lungs (ou anti-propaganda de anti-marketing)

coleciono desquereres:
desbotam ao sol interior
todas as blusas que não tenho

09/04/2014

da expansão

não pensar mais em termos de uma só vida
uma só pessoa

a chama é breve
e o tempo - quente - voa

06/04/2014

bambuzal ao vento

(Para M.)

como dois galhos
quebrados partidos cortados
apoiados precariamente

como dois lunáticos
descabidos, desencaixados
irmanados um no outro

como dois budas
sentados em meditação
lado a lado

shamata impuro

as pessoas que mais falam de amor
não sabem amar
(os poetas)

paraíso
inferno
café
instantâneo

vi o grito
dentro da floresta escura
(samsara)

contemplei as emoções
que eu deveria ter
(correndo atrasado)

o grito do outro incendiou árvores
e meu estômago ácido

mas silenciei sobre o som
de todas as minhas quebras

04/04/2014

para adélia prado

gosto de adélia além das palavras

eu nasci ela escrevendo bagagem
depois, 7 anos no deserto

máscaras
enterrando
rostos

as roupas inúteis na areia
a fé em pó

deus e seus teóricos nos separando
mas o sagrado nos unindo

poesia sem enfeite
a casa da vó

o momento mágico:
da areia quente
brota uma flor

03/04/2014

vamos indo

o céu dos teus olhos prometem água
vamos partindo sob nuvens longe
sob um sol alto

vamos sem sobressalto
sorrindo poemas sem som
pelos caminhos

02/04/2014

sonho

na beira oval do silo imenso

tenso - a porta aberta me sai

do fatigado peito, asilo
o mesmo objeto em sincronia:
uma maçã, um coração, uma agonia

mas o redondo não cai

não estranho nem adio:
um passo e