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Escritor, psicanalista e poeta nascido no Rio de Janeiro em 1976. Considerado um dos poetas brasileiros mais representativos da década de 2000 na antologia Roteiro da Poesia Brasileira (Global, 2009), é autor de vários livros publicados gratuitamente em seu blog, cujos melhores poemas foram reunidos em A Magia da Poesia (Papel&Virtual, 2000), Corte (Ibis Libris, 2004), rio raso (Patuá, 2014) e o budismo e o tinder (Multifoco, 2020). Mantém o bem sucedido site “A Magia da Poesia”, que teve mais de um milhão de acessos em 2012, onde divulga a obra de grandes poetas. Seus poemas já foram selecionados para livros escolares, traduzidos para o russo e publicados em diversas revistas literárias.

29/04/2013

um sonho não meu

esquistossomos:
sintomas esquisitos
somos

o outro nunca é um livro aberto
e, folheando-o,
saem serpentes
sobem por seus braços
misturam-se a seu ser:

somos o mesmo

28/04/2013

pipoca

a poesia
saliva e salva

(palmas para Jesus)

um meio do indizível
se aproximar do impossível

casca de milho
presa na gengiva

entre o quase
e o pus

26/04/2013

maior

o mundo calmamente observa
mosquitos nos pneus
guerra, fome, epidemia

tudo silenciosamente observa
o sol voltando no outro dia

imagem: NASA

25/04/2013

vermelho tarde

meu romance mora
numa casa sobre o rio
longe, longe, quase impossível

uma ponte
entre o corpo poente
e o sonho distante

imagem: Irene Becker

23/04/2013

ja_nela

a casa rui
desaba
finda
escapa
flui

(sob um sol apático
e convexo)

porque
alicerçada
em alguém fora dela?

ou por causa do muro
concreto duro
plexo sem
janela?

poema molhado em imagem

da lama ao belo:
troco meu castelo
por papel-toalha

imagem: Terry Richardson

malas prontas

tudo que ela pressente é ruim

vivemos com medo do presente
numa caixa nem desembrulhada

eu com o pé na estrada
ela com a mão no fim

fingimos assim
a possibilidade nua
de partir nossa noite
em duas

depois choramos secos
celebrando tristes
a realidade escura
e o caminho mais largo

um pra cada lado

(ambos olhando pra trás)

22/04/2013

obras

cano ligado a cano ligado a cano
poesia é vazamento
oceano

21/04/2013

parque natural municipal de marapendi

não ando na beira da floresta:
sou a floresta que não cabe em mim
(de frente pros jardins dos ricos)

o mato
(muito mais bonito)
aplaude o vento
que lhe balança

somos
som e dança

não delimito com cercas
áreas retangulares
de minha natureza

silencio

leio amplo
o poema-céu

um tiê sangue
cruza o verde azul:
amor cortando meu plexo frio

amor antigo e novo
que todo dia sangra sorrindo
e nasce chorando:
uma flor amarelo profundo
sobre o lixo do mundo

longe, jogam futebol aos berros
passam voando em carros desertos
abrem cancelas lendo jornal...

enquanto a floresta
de cheiros, silêncio e a mais bela dor
caminha lentamente comigo

imagem: Fabio Rocha

cagões

semáforos só amarelos
somos
quem semeamos
(papel higiênico
nos oceanos)

20/04/2013

a ilha e a sede

perdemos o orkut pro facebook
o facebook pro orkut
o brilho nos olhos
o rumo...

e a falta de prumo
torna a norma o pranto

algo deforma
qualquer instante
ou possibilidade
de acalanto

quebra

gasta

trinca

há algum fantasma que respiramos
algum mistério de algas nos pratos que comemos
algum contato extraterreno
alguma energia telúrico-jurídica
alguma carta do i-ching
alguma macumba de osho
o preço do tomate
ou apenas o tempo

tirando o sal do gosto
pesando o olho cansado

ao mesmo tempo
algo como o que já somos
ainda é
ainda temos
sem esse sono...

sinto fome do que fomos.

mas a voz crispada em grito
as lágrimas que não precipito
o ouro apertando a mão
o não apertando o são
a guerra...

nada mais inútil
que um poema
ou um livro cheio deles
quando o que falta é água
e tens sede
de nada

19/04/2013

do método

a poesia ruim
dança p(r)ensada
no precipício
entre a inspiração
e o sacrifício

a poesia
muito revisada
se perde de si:
não diz nada

a poesia
muito reescrita
nem em si mesma
acredita

a poesia
muito perfeita
sobre seu túmulo
deita

18/04/2013

afilhada

trago a voz definhada pelo desuso
mas o peito permanece querente

medito pra me afastar-te
e esbarro-te em mim

dentro desse calor sem fim
entendo a pressa dos helicópteros quentes

giro
(tonto)
mas não me elevo

afiadas:
a hélice sua
a minha dor

bem coletivo

o ligeirão segue
atropelando vidas
pelo bem da competitividade
nas olimpíadas

17/04/2013

fico

tonto, quebro o prato
da regra contra o ato

desacato em protesto íntimo
tal desencontro

dito isto, constato:
gastrites à parte,
parto

16/04/2013

quando o assunto é vida

estico-me em direção...

a mão parada à força:
a parede do não

sem circulação

acordo
a_corda enforca o pulso
e corta o espontâneo

a razão

escolha que encolhe:
não mergulho e dor
ou mergulhador?

há razão?

encurvo-me tonto em torno do plexo
com certeza profissional:
sou completo amador

13/04/2013

desap_ego 911

o terror
contra o terrorismo
não funciona, amor

é preferível deixar-se
fuzilado sem chorar bis
plantando flores incríveis
em fuzis

modus operandi

por não agir
nunca
no momento do agir
(principalmente no sofrer)
meu corpo racional se curva
em lordose cervical

concha ao redor do plexo
caramujo que adia
a energia do agora

passam dias,
gastrites, tonturas, tendinites
e faço um poema complexo

12/04/2013

poder

repasso
passo a passo
o lugar de minha força

o amplo céu
lentamente
desiste da luz

pescadores silenciosos
tentam tirar do mar
a última cor

sinto demais
pra não querer
o infinito

ar-te

afã de arfar-te
provar-te a mais íntima letra
beber-te a boca

ovo

amanheço o sonho
gemo alvorada
clara de novo

11/04/2013

brasil, fora da novela

sétima economia do mundo
que na educação
perde
pro azerbaijão

oshíssimo

adio para nunca
a tensão na nuca

fatos não importam:
nada é seguro

e sempre haverá
gente erguendo muros
gente abrindo portas

10/04/2013

com_pressa

esqueço sonhos, poemas
as vértebras fora do lugar
o plexo fora do lugar
o nexo fora do siso

sigo

porém

complexo

no trabalho, em tempo

o não dito
entope
de esgoto
o maldito
ar condicionado

5 da manhã

somos o sono do sonho

a voz da noite é rouca
e tempo
é sinônimo de pouco

07/04/2013

da consciência atrasada

nem a palavra mais certa
desfaz
a errada

05/04/2013

deschuva

nasce sem alarde
um sol sorrateiro
no final da tarde

contabilidade pública e privada

o bom silêncio
chove gelado:
lado de fora

montanha verde
que imagino
quase risonho

enquanto gasto
a minha idade
com bens contábeis
e patrimônio

04/04/2013

as as as

o mundo é fundo
os artistas pulam
todos morrem
a maioria se mata

nem a ufologia mística explica a poesia

a aproximação do poema bom
é meio incrível
mas se sente
assim, exatamente:

um disco voador enorme
vem de cima
sempre de cima
invisível
incrível
insolúvel
indivisível
da nona de Beethoven

pode-se estar pensando no dilema
entre forma e conteúdo
ou outra inutilidade...

e motos cortam com retas
sua vida de sono
em todas as direções

não há você
não é você que faz
nada

nem os intraterrenos
(eram os deuses astronautas?)

Carmina Burana profana o sonho morto
de gastar a vida
acumulando bens
e matando o tempo

cores em profusão

e
depois
decepção:

a prisão não é apenas o escritório!

em todo o universo
exceto no verso
não se pode
beijar a gostosa
ou matar o inimigo

apesar dos literatos antigos
tentarem afastar o simples do genial
Beethoven diz mais em quatro notas
do que toda a crítica mundial

não fode!

e o verso acaba

sorriso

e o verso finda

precipício

e depois de acabado
não era bem isso

prévia de um poema bom (um poema ruim)

está errada essa miséria
de só viver nas férias
e no maior da vida
em escritórios sem avidez
driblar o tédio com funções
que qualquer máquina ou programa
faria melhor que vocês

gastamos a vida
matando o tempo

normas fecham

a palavra idéia
ao perder o acento
torna-se fechada

03/04/2013

melodia

queria que a poesia tivesse
metade da capacidade
de reversão de polaridade
que a música me faz

o corpo esquece até que coça e sua
a alma flutua
direto
do inferno pro céu

autoclínica

poesia tosca
sempre o mesmo ponto:
que a minha busca
seja mais encontro

02/04/2013

chegando aos 40

dou voltas ao redor do
copo      meio      vazio
fazendo  tempestades

definições líquidas

famílias são agentes econômicos
espiões são agentes secretos
poemas são desagentes

história da minha poesia (nossa)

eu
eu
eu
eu
eu
DeuS