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Escritor, psicanalista e poeta nascido no Rio de Janeiro em 1976. Considerado um dos poetas brasileiros mais representativos da década de 2000 na antologia Roteiro da Poesia Brasileira (Global, 2009), é autor de vários livros publicados gratuitamente em seu blog, cujos melhores poemas foram reunidos em A Magia da Poesia (Papel&Virtual, 2000), Corte (Ibis Libris, 2004), rio raso (Patuá, 2014) e o budismo e o tinder (Multifoco, 2020). Mantém o bem sucedido site “A Magia da Poesia”, que teve mais de um milhão de acessos em 2012, onde divulga a obra de grandes poetas. Seus poemas já foram selecionados para livros escolares, traduzidos para o russo e publicados em diversas revistas literárias.

29/07/2016

eu te amo mas tô no tinder (armadura de ouro)

eu te amo mas tô no tinder
você pode me ferir que a fila anda
nossa poesia não rima
mas não é você quem manda

eu te amo mas tô no tinder
marco e desmarco nosso jantar
conforme aparece alguém melhor
mas não deixo de te amar

eu te amo mas tô no tinder
a mente sempre ocupada
o facebook me força a sorrir
mas nunca solto a espada


27/07/2016

mistério

o que mora no silêncio
das mulheres de 18?

romantismo sem romance?
sonho sem meta?
esperança de fim do mundo?

a mais pura incapacidade
de andar de mãos dadas
ou apenas
nada?

25/07/2016

basta

estamos todos descalços
correndo no asfalto
atrás de alguém que se afasta

estamos todos chorando
perante a falta de controle

estamos todos parados


*OBS.: A inspiração pro poema:

Saí com o carro da garagem e tinha uma mulher correndo atrás de alguém e gritando "Pára!". Encostei o carro ao seu lado, abri o vidro notando que as lágrimas escorriam por seu rosto e perguntei "Como posso te ajudar?" Ela pediu carona. Destravei a porta, ela entrou e notei que estava descalça, com um vestido preto muito curto. Pediu pra seguir um homem. Perguntei se ele tinha roubado ela. "Não, é meu marido." Deixei ela perto dele, ela me agradeceu e seguiram pelas ruas gritando.

O nível de sofrimento e confusão que o amor romântico pode causar nas pessoas (não me excluindo) sempre me parece inacreditável.

21/07/2016

do sofrimento como combustível

pequenos prazeres
antes da foice

pequenas mortes
antes dos dias úteis

quantos anos gastos
esfregando a lâmpada mágica
esperando o gênio
para pedir mais lâmpadas
ainda mais mágicas?

quanto tempo de treva
até você acordar?

quanto tempo leva?

19/07/2016

o choro de todas as coisas prestes a morrer

frutos caem no telhado
acima de nossas rugas

a natureza apresenta suas sombras
e o sagrado faz as luzes do mundo
um pouco mais fracas

nessa época estranha
(que é sempre)
aumentamos o ímpeto nas distrações
mas elas também caem no telhado
como folhas
que não notamos mais

todas as distrações do mundo não adiantam
mais que um fruto podre
no telhado

cansados de tudo que nasce e morre
desperdiçaremos até quando a luz
nascendo e fazendo nascer?
morrendo e fazendo morrer?

verbo querer

o poeta quer ser lido
sem sucesso

o poeta quer ser comprado
com menos sucesso ainda

o poeta quer que o poema dê frutos
além dos poemas

quer opiniões, resenhas e mulheres

quer dias melhores

o poeta quer ser lindo
sem sair de si
(e já saindo)

poema já mil e um

percebo:
meu amor por jammylly
é um inutensílio

noto na mesma noite
a perfeição dos seu cílios
numa foto recente

mas a distância ainda
vence
a vontade do corpo

o escuro roto de recife
me deixa insone
no rio de janeiro

vejo filmes, escrevo palavras e seu nome
o ano inteiro
e não passa esta fome

18/07/2016

ana carolina no supermercado

ana carolina empurrando o carrinho
fazendo compras básicas
e meus olhos pequenininhos
começando a ouvir música clássica

esqueço a falta da paz mundial
imaginando a maciez de lycra
das pernas de ana carolina
naquelas calças de ginástica

a silhueta de ana carolina
é um sonho há muito esquecido
um passo perto do pássaro
o voo de um sonho bonito

ana carolina me sorriu
e o supermercado se abriu
em um céu de julho

strauss sem stress

asas sobre casas

confissão

se eu contasse
o que vai pelos subterrâneos...

além das lógicas matemáticas
além das lendas com início, meio e fim

a essência dos vulcões:
o fogo

a constância de minha mente:
teus
cabelos
vermelhos

17/07/2016

para ela, que não consegue mais ir de mãos dadas

minha deusa ruiva e quente
com pele capaz
de perfumar ainda mais
o perfume do sabonete

minha deusa branca
mais alta que o altar
que me deixa ensaboar
suas pernas longas

minha casa é teu abraço
e a surpresa do teu beijo
esquenta ainda mais
o calor do meu desejo

15/07/2016

Musa

ousar falar em amor
num tempo de mentira como regra
onde tudo rui antes de começar
onde todos riem para fotografar
é arriscar muito

arrisco

arrisco em rabiscos de músicas e poemas
em sorrisos sérios
em arabescos de palavras
para amanhecer o horizonte da mais linda franja

não somos anjos...
mas teu corpo
mas teu sorriso
mas tua beleza
mas tua voz...

nós

o que temos flui além do instante
como um espelho se vendo mais limpo
em outro espelho distante

tua voz me emudece
e enquanto o inferno aqui se repete
com as pessoas de perto passando
você segue
firme presente fino que o presente tece

você segue
você voz:
canta, dá aula, declama, ama

ama tanto
que ama em cada ato
e seria desacato
não chamá-lo de milagre

amo e mais um milagre me derrama junto:
no escuro de uma sexta-feira sem esquinas
sozinho no apartamento
escrevendo um poema
na mais completa paz

14/07/2016

poema para sharmila chambó

sharmila chambó
faz compras no supermercado
lentamente
com graça e afeto

seu andar mais alto
meu sonhar mais alto
(reino dos deuses sem desafetos)

dou mil voltas em torno de sharmila chambó
sem comprar nada
sem saber que ela é sharmila chambó
(ela nem vê)

detecto a magia do momento
atento para anéis nas mãos de sharmila chambó
de noivado ou casamento

não há
não há
não há

há cílios incríveis
olhos claros
ela mais alta que eu
escolhendo queijos
na altura do meu queixo

há quadris mais largos e perfeitos
do que o padrão estúpido das modelos muito magras
e finjo olhar umas amêndoas sem jeito

bem
perto

tomo coragem e pergunto assim:
"gosta de poesia?"
ela sorri o infinito e diz que sim
mas que não costuma ler muito

peço contato ou telefone
para mandar este poema nascente
ela me dá seu nome
eu me afasto contente

12/07/2016

diapasão

curvados e sem direção
passos por sobre o vento
mas a noite enorme

desvios, atalhos, fugidios
espantos e espantalhos

corvos, coitos, nomes
se perdendo no azul
da rosa que não te dei

um rei joga cartas sem números
eu ainda conto
eu ainda
morto

quando desistir?

não está adiantando

a rã na água morna
a rã na água quente

não está adiantando

nada

11/07/2016

just too good to be true

somos a geração
depois do amor possível

líamos os mesmos contos de fadas
mas é época de supermercados
promoção e decepção

uso o vento da paixão
para seguir em frente
(sem rumo, sem barco, em frangalhos quentes)

não há chance de não se ferir
na dança toda lâmina
(cada um olhando a sua)

não há possibilidade
que supere
a pressa

estamos todos de mãos separadas
querendo além
das mãos dadas

alianças? provisórias
alianças? provisórias
alianças? provisórias

interrompemos a epifania
para fotografar
e checar o whatsapp

08/07/2016

lenz

será que as lentas lentes
sob as sobrancelhas ágeis dela
inda cruzam por estas letras?

love is a dog from hell

sofrimento por todo lado
e fotos sorrindo

gente acabando, terminando, perdendo, conseguindo

os verbos me cansam

você foi lalaialalaiala
você foi lalaiala
lalaialalaia
(sorrio da cara do cantor triste da música triste
no bar triste em copacabana triste)

abraço o passado
exatamente como foi
é
e será

abraço todos que somos
e serenos

tivemos momentos bons
e ruins
teremos momentos bons
e ruins

ah, quando formos apenas
abraço enfim

05/07/2016

é - não é - mas é

poesia em greve de silêncio longo
pelas musas amando
de longe



02/07/2016

meditar sem meditar

aceito
visceralmente
a impermanência de tudo

observo
com equanimidade
o sofrimento de todos

entendo
sem medo
que todas as ações tem consequências

01/07/2016

sentada na cama

busco a palavra mais nua
pra te desenhar em voz
publicamente