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Escritor, psicanalista e poeta nascido no Rio de Janeiro em 1976. Considerado um dos poetas brasileiros mais representativos da década de 2000 na antologia Roteiro da Poesia Brasileira (Global, 2009), é autor de vários livros publicados gratuitamente em seu blog, cujos melhores poemas foram reunidos em A Magia da Poesia (Papel&Virtual, 2000), Corte (Ibis Libris, 2004), rio raso (Patuá, 2014) e o budismo e o tinder (Multifoco, 2020). Mantém o bem sucedido site “A Magia da Poesia”, que teve mais de um milhão de acessos em 2012, onde divulga a obra de grandes poetas. Seus poemas já foram selecionados para livros escolares, traduzidos para o russo e publicados em diversas revistas literárias.

31/03/2016

branca

este é um poema
sobre a esperança
que sufocamos com o silêncio

este é um poema
sobre o medo
que trancamos nos armários do tempo

este é um poema não dito
escondido
direto ao teu ouvido
pensando em teu sorriso

29/03/2016

samsara

você sabe o caminho
mas os passos
vão sozinhos
pro outro lado

25/03/2016

res(pirar)

quem cria
a sua
ansiedade?

24/03/2016

caminho sem mim

entre a probabilidade
do crepúsculo
e da tempestade
não me busco

a nesga do sol
é um retângulo de ouro

o vento paralisa

silêncio
entre as palavras
da canção

a máquina do mundo

um instante rosa maior
rosa deserto

comunhão
além da prosa
e do verso

23/03/2016

revendo beleza americana

sutilmente
o outono relampeja deslimites

por mas que haja paredes
nelas
há janelas

e o vento leva
leva a união de tudo
além dos cômodos
e dos incômodos da solidão

acumulamos faltas
em vontades
de coisas
ou de sermos únicos para alguém

então compramos
cães e gatos
ou explodimos aeroportos

para não ver além

22/03/2016

dolores

a palavra contamina
o silêncio, a rima, o ato

teu tato

a palavra contamina o fato
mas arrisco uns riscos
no papel acima

teu nome

a palavra mata
a palavra anima
pela palavra sonho futuros atos
de prazer passado pra não morrer hiato
pra não fechar em luto

não lembro mais o que pedi
com teu cílio no meu dedo
não lembro mais o que perdi (teu cheiro)
mas devo ter pedido errado
pois agora é esse bando com medo
numa dança entre o desconforto e o desapego
tentando martelar solidez na água
afundando em nadar além da mágoa

mas o pior mesmo é quando tento
não fazer um poema romântico

plural

sem técnicas ou metas
aumentam as
chances

21/03/2016

lenda linguagem

quantos passos
entre o céu
e o pássaro?

tentando mensurar
de dentro de nós
os nós infindos

desatar
é verbo além

20/03/2016

progressivamente

a música da vitória
sobre si mesmo
é o silêncio

além do tempo

equinócio de paz
onde enterro meus planos

nasce uma árvore lilás
sem enganos

15/03/2016

melodys celestines

deixar-lhes a casa sempre
com a porta de entrada e de saída abertas

tal qual uma meditação
com pensamentos entrando e saindo
sem lhes servir o chá do apego

13/03/2016

o tempo todo

a grande perfeição
está parada
no céu de olhos sãos

silenciosa e imensa
não toca a vida tensa
nem em canção

mas se pudesse ser música
seria a voz dela
ou a meditação 
de massenet

voo?

o pássaro pousa
seu olhar feminino
na ave futuro

duro

ela tem pernas longas
eu curto
duro um dia, dois
estranho o terceiro
nos entenderíamos no quarto

e passam

as pessoas passam
a vida toda sem ter
tempo

10/03/2016

do mesmo vermelho

do mesmo fogo
a paixão que queima alguém bem específico
e a compaixão que aquece a todos, sem exceção nem preferência

08/03/2016

revenant (missão)

enquanto reclamamos autocentrados
com a barriga cheia e o celular na mão
esquecemos as infinitas vidas
que não nos deixaram aqui
em vão

07/03/2016

pérola

beijo a palavra múltipla
na leveza da tarde
plena de beleza

a paz como certeza
no meio do rosto
embaixo do nariz

soneto do sono maior

estou de saco cheio
de ser feliz por essas beiras
essas frestas entre telas
essas festas entre elas

eu cantando
sem o arrepio
do pescoço dela
ao alcance do tato

eu imaginando
a mensagem no silêncio
sem senti-la com meus dedos

é muito tarde é muito cedo
é muito tarde é muito cedo
é muito tarde é muito cedo

06/03/2016

a fragilidade da salvação

ela é como uma bola
que não se pode tocar

o vento no verão
a destruir sua casa

a cura
que pode viciar

a perfeita medida
pra se perder sem mapa

remédio pro tédio:
doce envenenar

05/03/2016

meditação

restaura a dor do coração
cada construção derrubada

lá fora o mato alto
e o silêncio da noite
aqui dentro

o vento desinventa operários
todas as máscaras
todas as certezas
mais fracas que o vento

(lars von trier não é ficção)

a opção é não perder tempo
com murros, muros e meus
a opção não tem seguro
mas tem direção

04/03/2016

aceitação

em noites quase normais
meu romantismo de super-homem
eu deixo voar em paz
ouvindo suas velhas músicas
instrumentais

03/03/2016

retomada da flor

queimar navios
não pra curtir na ilha
mas pra ajudar na costa

meu tempo é pressa
e seja onde flor
o ponteiro das horas
me arremessa
meu amor

água mole

olho o papel branco e rio
porque (frio) olho seco
como se não houvesse mais pra onde olhar
e esse olhar corresse rio abaixo
sem pensar nas pedras, até o mar

02/03/2016

nunca sobra nada

perto da meia-noite
vendo o final do último tango em paris

reconheço estarmos todos perdidos
nesta merda de drama

e chego a preferir mentiras rápidas da puta
do que respostas demoradas da santa

lembro de minhas próprias mãos quase esganando um pescoço
brigas na porta da casa
malas atiradas no corredor
uma maldita novela mexicana

lembro do choro do lado de fora
da porta trancada
e de como eu deveria ter aberto o peito
pra pantera

lembro de outro grande encontro
de um beijo que era tango
e de tudo jogado no lixo
por raiva, medo e hábito

eu já estive em tantos lugares
em tantos papéis
que consigo agora
não me mover nem falar por horas

(talvez apenas isso importe)

tudo requer tempo
mas tenho pressa
e percebo que a direção de toda pressa
é a morte

todo nome é um tiro
e não há quem não seja maluco

o tempo é o caminho
da bela vista
à farpa no olho

o sonho realizado
jorra sangue encolhido
no canto da varanda
depois de cuspir escondido o chiclete

tenho dentes demais
pras palavras certas

01/03/2016

longe gatas miam

a tristeza mais bonita
é nos dias de chuva
depois do enlace do dia anterior
músicas de amor na vitrola
da avó

a tristeza pinga leve
poesia
se e somente se
olhar a vida breve
e a vontade de querer
fora do agora