escrevo o poema correndo
pauso o filme
entre o almoço e o celular
desligo o celular
as cuecas caindo
antecipo o fim do almoço
escapo
(cinco amores nas escápulas)
é como uma água cheia de fotos
fotos que se foram e esqueci
todos os meus ancestrais
que me fizeram estar aqui
e não sei se agradeço ou morro
corro da outra água revolta de pratos
os pratos dos armários excessivos
do apartamento de meus pais
vazio
água rodando
torvelinho do filme
de que corro
(
ela)
as fotos são importantes
porque você lembra delas
mesmo quando consegue deixar se afogar
todo o resto
agora vejo letras num caldeirão
e um mar sem fim de livros
fechados
eu lembro
por exemplo
da foto do
seu rosto lindo
que eu tirei logo depois
do nosso primeiro beijo
já apaguei todas
já não há nem a lembrança dos beijos
não é lindo o seu rosto que me assusta ainda
de quando em vez, em noites de uivos
ou em filmes românticos
apaguei tudo
mas eu lembro daquela foto
não tendo mais nada
guardo a lembrança amarelada
na casa laranja de Adélia
como uma dor
eternamente anoitecendo
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Imagem: Desenho de Fabio Rocha |