meu filho, meu filho

meu filho, ao encontrar conexão, não perca. não deixe raiva, orgulho, família, o que for te fazer perder ela. sonhei com ela hoje. vinte anos passaram e ainda sonho. estava na casa da minha avó com ela, onde eu era infância. dizendo que ainda gostava dela, notando que ainda gostava dela. pela conversa boa, pelo entendimento telepático, pela divisão de sonhos e poemas, pelo sexo perfeito, pela voz linda, pela comunhão de décadas. o que começou pela amizade se solidificou de uma forma muito mais natural e real e agora me vem em sonho longo como vontade de dizer a mim mesmo: não estás te boicotando nos inícios há vinte anos por não ser ela? e ao filho que não há: não desperdice o encontro.

olavo de carvalho

morreu
de

covid

a filha perdida

o tempo se expande na árvore
rugas caules silêncio

além do cansar
percorre cada corpo ainda
a vontade de sentido

tudo bruto
desencontro
desencanto

pedra na água
nada além

estado natural

acordo sem olhar o celular:
paz

o silêncio me molha
me molda

saio da roda do caos
e faço o poema
que me faz

fabiorochapoeta

eu falo e digito pra não esquecer: fabiorochapoeta
no email, no insta, no inferno: fabiorochapoeta

mesmo assim me perco de mim
busco empregos, musas, sentidos e coisas a buscar
tropeço em fugas e bocas
foco em metas

e eu no fundo querendo só me dizer: fabiorochapoeta

as revistas culturais me odeiam
as irmãs inimigas
as primas negacionistas

e eu querendo só me bastar: fabiorochapoeta

a morte vem a galope
devorando promessas
mas sigo sem migo
fabiorochapoeta

que eu falasse a língua dos homens

o amor subsiste?

no fundo da pérola de lágrima

últimos dias dos últimos anos

mas por quem

por quem choramos?

subsiste ainda dentro da falta?

resiste?

existe?

por baixo da pele que repete e sua

amarga e mórbida?

o amor subsiste nessa política?

nesses aplicativos?

nesses jogos?

o corpo todo seco ainda chora o olho

porém

ainda

inteligente

eu queria mesmo
conseguir acreditar
numa força externa
onipresente onipotente onisciente
que deixa o bolsonaro governar

apresentação

a dança fala sem palavras
a música fala sem palavras
este poema só de palavras

num avião sem couraça que um dia descarregará delicadezas

a vida
alta demais

reich reich reich

ela sensível
e pálida

se fechou:

crisálida

mas de todas as suas dores
nascerá
a ternura das flores

fique torto no seu canto: não ame

fique torto no seu canto: não ame
é tempo de medo
casamentos e democracias desmoronam no globo
e na globo

fique torto no seu canto: não ame

sorria, você está sendo filmado

há câmeras nos drones
nas ruas nos prédios nas casas nos satélites
automáticas nas árvores para fotografar onças

no entanto
onde estão os extraterrestres
os sasquatch os espíritos manifestos os UFOs os anjos
os mestres que levitam 
as pessoas verdadeiramente felizes?

sextou porque o instante existe

caia o que cair

ainda há meia lua no meio do céu

por mais que os tantos tantos passos passos

não tenham chegado a nada nada

além do lado de fora de um abraço

sigo o caminho escrevo e canto

porque o instante é tanto

moto perpétuo

catar feijão da sombra de sobras

ritmo e linguagem para gritar sempre o mesmo

com novos símbolos:

o vazio

arrepio de cansaço

do mesmo sempre outra:

colocar a felicidade nela

e espantá-la

(redução amplificada)

nenhuma lágrima

sísifo (sifu)

querer cultivar a paz
criando latifúndios de ira

na família o confidente
quando pode
dá com a língua nos dentes:
inimigo

(itabira)

e no mundo
com cara
de poucos amigos?

sobriedade
sobe a idade:
faltam menos anos para extinguir a raiva

medito: menos raiva
me dito: menos raiva
a coluna dói: me deito

divã antes do derradeiro leito:
psicólogo/psicanalista:
- seu tempo acabou

no longo espaço entre bukowski e buda (gratiluz)

as telas se comunicam
incertezas dentro

de certezas fingidas fora

redes sociais de rostos lutando para 5 curtidas

(pedindo doação)

e bundas com 5 milhões de comentários

(rasgando milhão)

lives e técnicas para vender

para melhorar sua vida

para canalizar formas-amebas através de anjos e tartarugas-ninja
(e as pessoas acreditam)

na índia um maluco que se dizia médium

matou 11 de sua própria família num ritual sem sentido

porque era maluco

e porque as pessoas acreditam

(deu documentário no netflix)

um passo a mais e eu me iluminava
um passo a menos e eu aloprava