cultivo meu cansaço
como bem mais precioso
a pilha de corpos mortos
que chamei de eu
o mar de lágrimas
que chamei de minhas
a chama
enquanto chama
chama
a cura
- Fabio Rocha
- Escritor, psicanalista e poeta nascido no Rio de Janeiro em 1976. Considerado um dos poetas brasileiros mais representativos da década de 2000 na antologia Roteiro da Poesia Brasileira (Global, 2009), é autor de vários livros publicados gratuitamente em seu blog, cujos melhores poemas foram reunidos em A Magia da Poesia (Papel&Virtual, 2000), Corte (Ibis Libris, 2004), rio raso (Patuá, 2014) e o budismo e o tinder (Multifoco, 2020). Mantém o bem sucedido site “A Magia da Poesia”, que teve mais de um milhão de acessos em 2012, onde divulga a obra de grandes poetas. Seus poemas já foram selecionados para livros escolares, traduzidos para o russo e publicados em diversas revistas literárias.
29/10/2017
28/10/2017
terra vista
quase todos os meus sonhos
são mais amplos que o mar
acordo maior que eu
até olhar o celular
algo como perceber a luz
no constante som do ar
baleias de fogo heroínas
arrancam âncoras de mágoa
palavras mágicas
pra voar na água
minha vida
é um navio brilhando dourado
no crepúsculo de letras
todos olham com aplausos
mas ninguém embarca
por completo
são mais amplos que o mar
acordo maior que eu
até olhar o celular
algo como perceber a luz
no constante som do ar
baleias de fogo heroínas
arrancam âncoras de mágoa
palavras mágicas
pra voar na água
minha vida
é um navio brilhando dourado
no crepúsculo de letras
todos olham com aplausos
mas ninguém embarca
por completo
26/10/2017
desci
o homem porco
precisa de muitos portos
por não saber nadar
o homem pouco
quer demais
para desperdiçar
o homem - o louco
aponta a seta para longe
pra se afastar
de si
precisa de muitos portos
por não saber nadar
o homem pouco
quer demais
para desperdiçar
o homem - o louco
aponta a seta para longe
pra se afastar
de si
23/10/2017
vale
enquanto nos distraímos no netflix
no celular
no jogo
no fora
empurramos as rugas pra cara
e apressamos as doenças e a finitude
nos intervalos
alguma música
alguma mulher
alguma impressão de que vale
tomamos pílulas
tecemos teses
morremos
esquecemos e somos esquecidos
e renascemos
e renascemos
no celular
no jogo
no fora
empurramos as rugas pra cara
e apressamos as doenças e a finitude
nos intervalos
alguma música
alguma mulher
alguma impressão de que vale
tomamos pílulas
tecemos teses
morremos
esquecemos e somos esquecidos
e renascemos
e renascemos
10/10/2017
retrato
o beija-flor sobrevive
sem salário nem plano de saúde
há milhares de anos
a globo
segue mostrando a economia melhorando
no "mandato do presidente temer"
a academia de musculação
no intervalo entre músicas
recomenda que conversemos com outros usuários
mas todos temos celulares
as cidades infectam o mundo
e a febre
é o suicídio
sem salário nem plano de saúde
há milhares de anos
a globo
segue mostrando a economia melhorando
no "mandato do presidente temer"
a academia de musculação
no intervalo entre músicas
recomenda que conversemos com outros usuários
mas todos temos celulares
as cidades infectam o mundo
e a febre
é o suicídio
Poesia temática:
autocrítica,
budismo,
crítica social,
meditação,
poesia,
política
09/10/2017
na falta de
a vida sem avidez
se avolumava
até o vórtice
vociferar volúpias de violões
v-i(-o-)l-e-n-t-a-m-e-n-t-e
verguei voar então
porque vivo enfim
o fim, como previsto, o vão
entre a vontade e o chão
mas a voz da visão
ainda me avoluma
e vomito versos
na falta de
se avolumava
até o vórtice
vociferar volúpias de violões
v-i(-o-)l-e-n-t-a-m-e-n-t-e
verguei voar então
porque vivo enfim
o fim, como previsto, o vão
entre a vontade e o chão
mas a voz da visão
ainda me avoluma
e vomito versos
na falta de
brilho da pele
acordo as 4 da manhã
porque no sonho eu acordava e via uma mulher
pairando alva na noite escura
e gritava por meu pai
vou beber água
pura
e adivinho a luz da lua
no chão frio da cozinha
a janela
cedo
confirma a teoria:
ela é a lua
e amar dá medo
porque no sonho eu acordava e via uma mulher
pairando alva na noite escura
e gritava por meu pai
vou beber água
pura
e adivinho a luz da lua
no chão frio da cozinha
a janela
cedo
confirma a teoria:
ela é a lua
e amar dá medo
05/10/2017
pede a ela pra voltar pra mim
a noite tem boca
com gosto de cigarro
a noite tem 15 anos
e bebe breja
porque não pediram identidade
a noite vomita
no tapete do carro
sem maldade
a noite beija outras noites
sem dizer palavra
os pais da noite
nem sabem
a noite é sempre quase
a noite dança
e veio só pra dançar
a noite canta
e veio só pra cantar
a noite cansa
a real poesia
é se cansar da noite
e do dia
com gosto de cigarro
a noite tem 15 anos
e bebe breja
porque não pediram identidade
a noite vomita
no tapete do carro
sem maldade
a noite beija outras noites
sem dizer palavra
os pais da noite
nem sabem
a noite é sempre quase
a noite dança
e veio só pra dançar
a noite canta
e veio só pra cantar
a noite cansa
a real poesia
é se cansar da noite
e do dia
Poesia temática:
budismo,
crítica social,
meditação,
melhores poemas,
poesia
01/10/2017
when amém loves a woman
a última chance de relacionamento duradouro são as mulheres evangélicas. na era de bauman, as mulheres evangélicas querem casar e ter filhos e não se separar. as mulheres evangélicas não fazem joguinhos. as mulheres evangélicas não levam suas filhas de 4 anos para tocar homens pelados em exposições de arte. as mulheres evangélicas ignoram bauman. as mulheres evangélicas se orgulham de seus esposos engordando porque elas cozinham bem. as mulheres evangélicas pensam que não trair é louvar a deus. as mulheres evangélicas comem carne. as mulheres evangélicas confiam em deus. as mulheres evangélicas confiam em seus maridos. as mulheres evangélicas têm orgulho de sua vaidade, de sua maquiagem, de seu perfume, de suas roupas, de sua feminilidade, de sua beleza. as mulheres evangélicas criticam as novelas da globo.
as mulheres evangélicas descomplicam: se querem filhos, pedem filhos a deus. se querem maridos, pedem maridos a deus. se querem dinheiro, pedem dinheiro a deus. se querem coca-cola, pedem coca-cola a deus. se querem milagres, pedem milagres a deus. se dá alguma merda, é o demônio. se algo vai bem, é deus. querer coisas para si não é pecado, deus está aí para atender em sua glória de criador do universo. deus é pai. nietzsche é o diabo. não se fala em outras vidas nem em darwin. mas - nesta vida - é saudável querer emprego, marido e sucesso para si. para a glória de deus. para o eu, filho de deus. zero complicações. orgulho da vitória. músicas lindas sobre o deus onisciente, onipotente e onipresente. rezar pedindo o que for, ler a bíblia e crer no pastor. no tempo que sobra, tentar trazer mais pessoas perdidas para o rebanho e estudar a bíblia. pura descomplicação.
é, não é, mas é uma pena a delusão de meu eu ver mais sentido no budismo, porque o coração dele está em pasárgada com as lindas mulheres evangélicas que não votam em bolsonaro até que a delusão da morte nos separe. a elas dedico este poema que não é poema.
as mulheres evangélicas descomplicam: se querem filhos, pedem filhos a deus. se querem maridos, pedem maridos a deus. se querem dinheiro, pedem dinheiro a deus. se querem coca-cola, pedem coca-cola a deus. se querem milagres, pedem milagres a deus. se dá alguma merda, é o demônio. se algo vai bem, é deus. querer coisas para si não é pecado, deus está aí para atender em sua glória de criador do universo. deus é pai. nietzsche é o diabo. não se fala em outras vidas nem em darwin. mas - nesta vida - é saudável querer emprego, marido e sucesso para si. para a glória de deus. para o eu, filho de deus. zero complicações. orgulho da vitória. músicas lindas sobre o deus onisciente, onipotente e onipresente. rezar pedindo o que for, ler a bíblia e crer no pastor. no tempo que sobra, tentar trazer mais pessoas perdidas para o rebanho e estudar a bíblia. pura descomplicação.
é, não é, mas é uma pena a delusão de meu eu ver mais sentido no budismo, porque o coração dele está em pasárgada com as lindas mulheres evangélicas que não votam em bolsonaro até que a delusão da morte nos separe. a elas dedico este poema que não é poema.
Poesia temática:
anti-religião,
autocrítica,
crítica social,
loucura,
poesia,
política,
prosa,
religião
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